2.11.18

cartas ao mundo



La Chica de Lunes, de Leopoldo Torre Nilsson | 1967

Para Alfredo Guevara
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O Torre Nilson de La muchacha de Lunes surpreende a todos, menos aqueles que já tinham visto no anterior El ojo en la cerradura um desvio do autor dos temas intimistas para uma realidade social. El ojo de la cerradura, apresentado no Festival do Rio em 1965, já fazia críticas ao fascismo. O que limitava o filme era sua linguagem fechada, que diluía o tema político numa reflexão quase metafísica. A crescente onda de agitação política pela qual passa a AL tem provocado crises e manifestações até mesmo no cinema argentino, dentre todos os cinemas latinos, o mais estetizante. Esta modificação viemos a sentir, com definição precisa, em La muchacha de Lunes, produção americana, embora o financiador, De Rona, seja um porto-riquenho. TN explicou em sua conferência de prensa que De Rona viveu um drama parecido e, tendo a ideia inicial, o convidou para fazer um filme que ele, De Rona, produziria. Trabalhando a ideia inicial com sua esposa, B. Cuido, TN realizou o filme em Porto Rico, com atores americanos, Arthur Kennedy e Geraldine Page.

Um furacão ataca Porto Rico e leva ao desabrigo centenas de famílias pobres. Uma empresa americana constrói edifícios em Porto Rico. O americano trata o porto-riquenho como um escravo e, quando o trata com simpatia, o trata com um paternalismo cristão típico do senhor pelo escravo. Com tintas claras e diretas, TN pinta este quadro e não hesita um só segundo em revelar esta relação colonial nos gestos, detalhes e significações. Ataca de frente a inconsciência e o egoísmo dos americanos, embora não os pinte como monstros devoradores de criancinhas, isto é, os coloca como seres humanos, também produtos de uma conjuntura social e econômica.

Glauber Rocha
1967