17.12.18

A cidade dos asfixiados

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Situada um tanto ou quanto distantes da cidade, num daqueles edifícios que comparei a gigantescas nacelas, esta escola tem como móveis, em lugar de bancos, balanços presos ao teto. Durante todo o tempo das aulas, os alunos ficam a se balançar em cadência. Não se veja entretanto nisto nada que se pareça com o que denominávamos, no meu tempo, algazarra. Não; aliás, uma coisa dessas não poderia acontecer; todas as precauções foram tomadas. A maior parte do tempo que os alunos passam nas classes é consagrada ao amolecimento de seu crânio. Tarefa tanto mais facilitada porque, como se lembram, os jovens bovrilos vêm ao mundo com o crânio nu e continuam calvos a vida toda. Em todas as escolas, regam-lhes a cabeça demoradamente com loções tépidas. Torrentes de emolientes, fluidos, líquidos ou oleaginosos, rios de shampoos amaciadores são despejados constantemente sobre as caixas cranianas dessas jovens esperanças, a fim de prepará-los convenientemente para a educação que vão receber. Ou melhor: esse tratamento constitui parte integrante do programa.

Com efeito, logo que os crânios estão suficientemente amolecidos, os jovens bovrilos são transferidos para a Grande Coneria, que corresponde mais ou menos à nossa Universidade, assim designada porque as cabeças são ali moldadas em formas de cones. Os crânios adolescentes, que se tornaram tão fáceis de amassar quanto blocos de barro, são metidos em moldes cônicos, de onde saem perfeitamente moldados em forma de cone, de tronco de cone, de cone duplo ou triplo. Clínicos especializados conservam-nos dentro desses moldes, até que tenham adquirido uma consistência definitiva. Acontece por vezes que algumas cabeças se mostrem refratárias à modelagem: serão outros tantos indivíduos fracassados. Felizmente, os casos desse tipo são bastante raros. Na maior parte das vezes, a operação obtém um êxito total, e a fábrica de cones pode orgulhar-se de seus produtos que, por seu turno, também se orgulham de terem sido tão bem moldados. Quando se tem o direito de colocar depois do nome: cone tríplice diplomado, ou: ex-aluno da Grande Coneria, pode-se olhar de cima para os contemporâneos e há toda probabilidade de que se venha a conquistar em breve o direito a uma barba postiça que desça até o umbigo.

Mas estou antecipando as coisas. Eu tinha começado a contar que se procede também -  o que não é menos importante - à educação dos pulmões dos alunos. Ensinam-lhes a respirar um ar especial, o droggaz, irrespirável para os não-iniciados. 

Régis Messac | 1972
Trad.: Heloysa Dantas