4.5.08

[Odium theologicum]

[Pier Paolo Pasolini, assassinado a 2 de novembro de 1975 numa praia, entre Ostia e Fiumicino]



Registro um sonho que tive.


A 4 de maio de 2008.
Uma espécie de
Odium theologicum.

Estive percorrendo por campos de concentração,
de mãos dadas,
com Pier Paolo Pasolini.
Caminhavamos por entre cadáveres.
Cães esfomeados que arrancavam
nacos de carne humana
faziam os Facistas & Nazistas sorrir.
Oh! Super-homens do grande progresso.
Ah! Grande ideal humano.
O escândalo corporal fazia-me gemer.
Apertei mais as mãos de Pasolini.
Encarei-o diretamente.

Por que, Paolo?
Por quê?
Isso tudo me parece um
Sabbat Infernal.
Uma liturgia de hienas rindo em campos escuros e úmidos nos cercea.
Rindo daquele modo do nada. Seriam, de certa forma, risos, Pasolini?
"A bestialidade sempre esteve presente", diz Pier Paolo.
É o seu Teorema? - indago.
Ao longe, ruínas. Será o que sobrou? São nossos os terrenos baldios?

Não há mais respostas.
Não há mais perguntas.
Oh! Grande progresso civilizatório.

Por que sou um desajustado? Pier, existe salvação para mim?
"Segundo São Mateus, há apenas a liturgia da matéria."
Sou,
sei que sou o último desajustado social.
Chamaram-me de herege.
Não diria o escritor que
há salvação, porém
não para nós?

Caminhamos por um longo tempo
sob um forte cheiro de carne podre.
Extensões de campos lamacentos.
Meu corpo em ruínas, Pasolini. Meu corpo!
"É preciso enfrentar o seu próprio escândalo!" - exclama, Pasolini.
"Pois saibam", continua o poeta, "que, eu, vivi o facismo em meu corpo."

Paolo, cansado, pede para que eu o enterre.
Não consegue mais.
O rosto ensanguentado chora.

Deita-se ao lado de um cadáver feminino com
seio amputado.
Começo a enterrá-lo
manchado de sangue a terra sagrada.
Uma fonte lacrimosa jorra ao lado do seu
olho esquerdo.

E a palavra
transumanar
desperta-me.

Estou banhado de suor.