19.8.08

[Nós que nos amávamos tanto]

[Charles Chaplin 1889 - 1977]

Nós que nos amávamos tanto

Lembra-se que nossos pés descalços
tocavam o capim que crescia
sob nosso desejo ardente e ríamos
puramente a ausência de todas as coisas?

Não tínhamos idéias e tampouco queríamos desenvolvê-las.
Apenas vivíamos, abraçados um n’outro,
a presença fiel de nossos corpos.
E amávamos. Era tão certo o amor
que amávamos até a negação de amar.


O céu era puro e sentíamos na boca o algodão das nuvens.
Éramos jovens, completamente crentes na vida,
e alimentávamos a essência de todos dias.
E sonhávamos. E pensávamos no futuro.

Certo dia, crescemos.
Adquirimos as chagas reais da existência
e nos convertemos em indíviduos aparentementes sábios.
Conscientes. Racionais.

Há, ainda, a emoção, que em tempos outros,
sentíamos aquecer o sangue? Arrepiar a pele?
Derramar a lágrima?

Perdemos a profundidade de ser apenas ser
absorvendo para os nosso corpo uma pequena ausência.
E o pior: incompleta.
Hoje, um copo para solidão.
Um copo cheio, enquanto,
na penumbra do quarto,
um retrato,
outrora sorridente, inexplicavelmente sorridente,

envelhece – através dos tempos –
com aquela impressão antiga,
cuja marca, agora, se sustenta na ponta dessa idéia.