16.10.09

entrevista

[por Fernandes]

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Houve em sua vida uma encruzilhada, um acontecimento, um desses grandes marcos?

Sim, minha vida sempre foi uma coisa muito tumultuada, talvez pelo meu temperamento, pela maneira como eu encaro as coisas. Um deles foi um amor, uma paixão de juventude que me marcou muito e que talvez sido decisivo na minha opção pela literatura: depois dessa decepção amorosa, cheguei à conclusão de que a única coisa em que eu podia confiar era a literatura.

[...]


Por que você escreve? O que é escrever?


Eu escrevo por essa necessidade de me comunicar. Se eu consigo de fato acender essa luz na linguagem, esse relâmpago, isso é uma coisa que não é só pros outros, pra mim significa uma "viagem" no sentido da maconha... Saí do real, saí das limitações, é uma experiência de liberdade, na verdade.

Tenho um certo tédio da literatura; a cada dia que passa, eu leio menos, escrevo menos, porque, de fato, se eu tiver de escolher, eu prefiro a vida.


[...]

Peço que escolha três palavras entre as seguintes e diga alguma coisa sobre elas: amor, cidade, poder, povo, solidão, solidariedade, prazer, violência, amizade, noite e silêncio.

A palavra que mais me fala é cidade, porque é nela que acontece tudo. A cidade é o grande convívio, é a comunidade e é, ao mesmo tempo, a própria experiência de vida coletiva. A uma hora dessas, nos mais diferentes pontos da cidade, está acontecendo tudo: o amor, a luta pelo poder, a solidão, a solidariedade, a violência.
Rio de Janeiro, setembro de 1988

[RICCIARDI, Giovanni. Auto-retratos. São Paulo: Martins Fontes, 1991. p. 264-277]