31.3.17

A televisão brasileira banaliza a realidade


A relação entre a comunicação de massas e o poder se dá na medida em que a televisão se transforma num grande instrumento de "desconversa" dos problemas centrais da realidade nacional e de um novo narcótico para iludir e oprimir um povo já suficientemente explorado nesses quinze anos de "milagre brasileiro".

A televisão brasileira se constitui num grande elemento de banalização da realidade, onde a guerra civil da Nicarágua é tratada da mesma forma que uma notícia sobre o campeonato de futebol ou a corrida de Fórmula 1. Tudo no mesmo nível, sem diferenciar significados. Por outro lado, ela forma uma falsa imagem do ator e atriz de televisão, na maioria escravos da máquina televisiva, que os transforma em marionetes. De igual maneira, participam de uma novela sem maior significado, como de um anúncio comercial que prova que o homem de ação fuma cigarro de tal marca. No fundo, atores, atrizes e técnicos de televisão são novos mitos impingidos ao povo pelos donos dos meios de comunicação, que são os mesmos que cobram juros junto aos grandes bancos, exploram o trabalho operário nas fábricas ou do campesinato no latifúndio.

Por isso, a comunicação televisiva é uma falsa comunicação, é uma comunicação de mão única, onde a mensagem que interessa ao anunciante de um produto qualquer ou ao dono da TV é que aparece ao povo e esse povo não é ouvido, não tem voz, só conta como índice de audiência dos Ibopes da vida. Por isso, digo que a comunicação de massa é repressiva, ela se traduz por uma ordem dos donos do poder econômico e político fantasiada de programa recreativo. Ao mostrar os "enlatados" norte-americanos, ela reduz o mercado de trabalho do ator brasileiro e transmite ao brasileiro miserável do terceiro mundo imagens do mundo desenvolvido que ele nunca chegará a conhecer na sua realidade. Neste sentido, se constitui num acinte ao pobres.

Poderia a TV tornar-se um poderoso instrumento de conscientização e mobilização da maioria da população, mas para isso muita coisa necessária ser mudada na ordem econômica e social e isso não interessa aos detentores do poder econômico e político dominante. A eles interessa um público televisivo que consuma os produtos anunciados e fique embasbacado com o baixo nível dos programas que lhes são oferecidos e ainda aja como uma espécie de o "escravo contente" que acha que tem opção como espectador, que na realidade consiste em mudar de canal de uma besteira a outra. Na medida em que isso narcotiza o povo, reforça o poder de quem o explora: nenhuma classe dominante dispensou o ópio para legitimar seu poder. Hoje, a TV atua como ópio do povo. Em suma, quem contribui para iludir o povo, engabelá-lo, fazê-los esquecer de seus problemas reais é um antipovo, está a serviço dos donos do poder.

Maurício Tragtenberg | 1979