Poesia Africana
Tradução de Manuel de Seabra
Lisboa, 1974
Todos pensam que eu sou um canibal
Mas bem sabem o que são as línguas
Todos vêem as minhas gengivas rubras
Mas quem as tem brancas
Vivam os tomates
Todos dizem que agora virão
Menos turistas
Mas bem sabem
Não estamos na América e de qualquer maneira
Somos todos tesos
Todos dizem que a culpa é minha e que têm medo
Mas vejam
Os meus dentes são brancos não rubros
Eu não comi ninguém
As pessoas são más e dizem que eu engulo
Os turistas assados
Ou talvez grelhados
Assados ou grelhados perguntei
Ficaram calados e olharam com medo para as
Minhas gengivas
Vivam os tomates
Todos sabem que um país arável tem agricultura
Vivam os tomates
Todos garantem que os vegetais
Não alimentam bem o agricultor
E que eu sou forte demais para um subdesenvolvido
Miserável insecto vivendo dos turistas
Abaixo os meus dentes
Todos se repente me cercaram
Prenderam
Prostaram
Aos pés da justiça
Canibal ou não canibal
Fala
Ah julgas que és muito esperto
E pões-te todo orgulhoso
Agora vamos ver o que te acontece
Qual é a tua última palavra
Pobre homem condenado
Eu gritei vivam os tomates
Os homens eram cruéis e as mulheres curiosas sabem
Havia uma no círculo que espreitava
Que com a sua voz raspante como a tampa duma panela
Gritava
Chiava
Abram-no ao meio
Estou certa de que o papá ainda está lá dentro
Como as facas estavam rombas
O que é compreensível entre vegetarianos
Como os Ocidentais
Pegaram numa lâmina Gillette
E pacientemente
Crisss
Crasss
Floccc
Abriram-me a barriga
Encontraram lá uma plantação de tomates
Irrigadas por riachos de vinho de palma
Vivam os tomates
Ouologuem Yambo nasceu em 1940, em Dogon (Mali), filho de um inspector escolar. Desde 1962 vive em Paris, onde se formou em filosofia, literatura e sociologia.