21.3.19

Porque a "Escola Moderna" aboliu os exames

1859 - 1909

Francisco Ferrer vê nos exames escolares atos solenes ridículos que satisfazem o amor próprio dos pais dos alunos e a supina vaidade de muitos mestres causando torturas nas crianças antes e depois. Ferrer critica aqueles pais que se preocupam com o fato de o filho não ter obtido o primeiro lugar na classificação dos aprovados, desconhecendo as angústias e ansiedades pelas quais passa o aluno antes e após as “provas”. Para Ferrer, a situação de exame é uma situação em que a criança está em confissões “forçadas” onde se lhe obriga a retirar de sua fraqueza psicológica as forças intelectuais, sobretudo no âmbito da memória, para satisfazer o amor próprio de alguns pais com grande prejuízo a integridade intelectual e psicológica do filho. A isso chama Ferrer de “miserável vaidade satisfeita à custa da vida moral e física da criança”, pois os professores, na sua maioria estereotipadores de frases feitas, inoculadores mecânicos mais do que pais morais do educando, o que mais lhes interessa nos exames é sua própria personalidade e seu status social. A situação de exame apresenta-se para Ferrer como um tribunal inflexível, onde o educando sofre tremendo interrogatório, constituindo o símbolo do atual sistema de ensino. O exame, prêmios e concursos escolares terminam com educandos carregados de diplomas e outros símbolos escolares. 

Ferrer critica a competitividade, mola do sistema de ensino que leva o educando a procurar superiores a admirar ou inferiores a desprezar. A procura de “ser mais do que os outros” pressupõe a expectativa da máxima aceitação do educando pelos professores ou familiares. Sem dúvida nota Ferrer que há pessoas que nada fariam sem a expectativa de uma recompensa, mesmo simbólica. A competitividade no ensino leva, segundo Ferrer, a excesso de trabalho intelectual e físico, que deforma as inteligências, desenvolvendo certas tendências e atrofiando outras. Qualquer preocupação, seja familiar ou pessoal, fica em segundo plano; “os candidatos sérios não devem aceitar distrações artísticas, nem pensar no amor ou na coisa pública, sob o risco de fracassarem”. 

A existência do sistema de notas para avaliação representa, para Ferrer, flagrante injustiça, pois sacramenta desigualdades, “pois uma nota ou classificação determinada mudaria se certas condições mudassem”. Ferrer propõe aos pedagogos que se dediquem “a inspirar amor ao trabalho sem sanções arbitrárias, pois já existem sanções naturais e inevitáveis”. Sobretudo, evitemos fornecer às crianças a noção de comparação e medidas entre os indivíduos porque, para que os homens apreciem e compreendam a diversidade infinita que existe de caráteres e inteligências, é necessário evitar a figura da concepção imutável do bom aluno.

Mauricio Tragtenberg