Só prospera a violência policial sistemática quando camadas superiores lhe oferecem cobertura, isto é, quando o comando das polícias, as autoridades políticas, a Justiça e o Ministério Público (MP) fazem, em comunhão, vista grossa para a violação de direitos humanos na base da pirâmide social. E quando esse fenômeno ocorre, continuamente, ao longo de décadas - interrompido por alguns esforços temporários, afinal derrotados - essa aliança de agentes institucionais estimula a criação de incubadoras de redes criminais, em cujas teias se associam atores de todos os níveis da escala, mesmo que suas doses de responsabilidade sobre o caos e a barbárie sejam diferenciadas. Em graus distintos, são todos cúmplices. Observem: a economia política da corrupção e da violência - violência policial e corrupção policial estão, insisto, organicamente articuladas - corresponde a uma dinâmica que não se estanca na porta das delegacias, dos quartéis e dos batalhões. Os X-9 enlaçam para baixo, ligando grupos policias a criminosos comuns e os fundindo na prática. Os deputados permeáveis às seduções do submundo enlaçam para cima, condecorando assassinos de aluguel fardados ou engravatados, legitimando seus esquemas e suas ações. O MP e a Justiça abençoam esses entrelaçamentos perversos não só quando fingem não ver os crimes perpetrados em larga escala por governadores, por exemplo, mas, sobretudo, quando, no varejo cotidiano, toleram a brutalidade policial letal como "mal necessário" para "limpar a sociedade de maus elementos". Em nome do bem e do bem jurídico, alimentam o mal e o instalam nos centros de poder.