Como muito bem observa Afonso Arinos de Melo Franco, acreditamos na salvação pelo acaso, e, fiéis a essa crença, vivemos à espera de milagres, da sorte grande ou de uma pepineira na forma dum bom emprego público.
Temos sido - com raríssimas exceções - governados por golpistas, imediatistas e "carreiristas", por homens sem espírito público que nunca olham para o futuro. O que os move é um insaciável apetite ou, melhor, uma insopitável gula: desejo de lucro, grande e imediato, vaidade de posições de mando, vontade de poder. [...] Nossa democracia, essa às vezes nem de fachada é. Não temos planos: improvisamos. O trabalho que um secretário de Estado inicia não é continuado por seu sucessor, pois este quer ter "seu plano", que no fim de contas não passa de outra improvisação. Tem predominado entre nós o paternalismo. Temos tidos governos de classes, grupos e famílias. [...] O Brasil é um país de intermediários. [...] Gastamos mais dinheiro com polícia que com instrução, como se achássemos que cadeia é coisa mais útil que escola. Às vezes procuramos resolver nossos problemas sociais por meio da força, e isso me faz lembrar um médico doido que amordaçasse o paciente para, impedindo-o de gemer, criar a ilusão de que ele deixou de sofrer.
Erico Verissimo | 1944