Comunicação num mundo distópico:
small talk - conversas vazias
O Admirável mundo novo era originalmente uma denúncia da falsa felicidade que Huxley via nos Estados Unidos e Adorno bem caracteriza no ensaio como "campo de concentração que se toma por paraíso". Seus prisioneiros, no entanto, não se revoltam, mas se adaptam, se integram, anulando-se como seres autônomos.
Essa distopia que se quer utopia foi antevista pelo autor "a partir do estado atual da técnica". Por seu desenvolvimento e sua liderança no processo de globalização, o "american way of living" atinge todos os países. Comparando essa sociedade integrada com os ideais da Revolução Francesa, vemos que Huxley substitui os lemas libertários "igualdade, liberdade e fraternidade" para "comunidade, identidade e fraternidade", que correspondem, grosso modo, a seres estandardizados que passivamente se sujeitam a uma sociedade administrada, na qual "a coletivização total corresponde à dominação total".
Nessa fantasia de enredo elementar (a expressão é de Adorno), a existência de seres humanos envoltos em relações mercantis vazias de conteúdo existencial faz a comunicação restringir-se aos pensamentos e formulações do tipo small talk, conversas vazias. Nessas não-falas o não-entender transforma-se em virtude. Homens e mulheres perdem seus tempos com assuntos banais e acríticos. Como as relações deixam de ser humanas e adotam formas mercantis, comerciais, tais falas vazias ocorrem não entre cidadãos ou seres autônomos, mas entre simples consumidores. Observemos que, hoje em dia, esse caráter de insignificância já se dissemina pelo mundo todo, dado o crescente predomínio da indústria cultural fortalecida pelos movimentos conflitantes de uma globalização que é, ao mesmo tempo, inclusiva e exclusiva.
Newton Ramos
