20.12.22

Aula de 17 de março de 1976


Tomemos se vocês quiserem a morte de Franco, que é um evento apesar de tudo muito, muito interessante, pelos valores simbólicos que faz atuar, uma vez que morria aquele que tinha exercido o direito soberano de vida e de morte com a selvageria que vocês conhecem, o mais sanguinário de todos os ditadores, que havia feito reinar de modo absoluto, durante quarenta anos, o direito soberano de vida e de morte e que, na hora que ele mesmo vai morrer, entra nessa espécie de novo campo do poder sobre a vida que consiste não só em organizar a vida, não só em fazer viver, mas, em suma, em fazer o indivíduo viver mesmo além de sua morte. E, mediante um poder que não é simplesmente proeza científica, mas efetivamente exercício desse biopoder político que foi introduzido no século XIX, faz-se tão bem as pessoas viverem que se consegue fazê-las viver no mesmo momento em que elas deveria, biologicamente, estar morta há muito tempo.


Michel Foucault