8.4.24

Droga e cultura


Por que as pessoas tomam drogas? Não compreendo, mas de certo modo explico. As pessoas se drogam por falta de cultura. Falo, evidentemente, da grande maioria ou da média dos drogados. É claro que quem toma drogas o faz para preencher um vazio, a ausência de alguma coisa, que causa desânimo e angústia. É um substituto da magia. Os primitivos estão sempre diante desse terrível vazio em seu íntimo. O medo da perda da própria presença; e os primitivos, precisamente, preenchem esse vazio recorrendo à magia, que o explica e o preenche.

No mundo moderno, a alienação devida ao condicionamento da Natureza é substituída pela alienação devida ao condicionamento da sociedade: passado o primeiro momento de euforia (iluminismo, ciência, ciência aplicada, comodidade, bem estar, produção e consumo), o alienado começa a se sentir sozinho consigo mesmo: portanto, como o primitivo, ele se sente aterrorizado pela ideia da perda da própria presença.

A ação tem sempre uma função similar à droga: agir antes de pensar. Também o trabalho que serve para produzir é uma espécie de droga. O que salva da droga propriamente dita (ou seja do suicídio) é sempre uma forma de segurança cultural. Drogar-se é um fenômeno dos que são culturalmente inseguros. A passagem de uma cultura humanista para uma cultura técnica coloca em crise a própria noção de cultura. É por isso que há tantos jovens que tomam drogas.

Carecer de certezas culturais e, portanto, da possibilidade de preencher o próprio vazio de alienado, se não de outro modo, por meio da auto-análise e da consciência (individual ou de classe), significa - em termos banais - ser também ignorante. Com efeito, a crise da cultura faz com que muitos jovens seja literalmente ignorantes. Em suma: que não leiam mais, ou que não leiam com profissionalismo.

E mais: os jovens ignorantes que não tomam drogas, e que talvez se droguem através da ação política especializada (que é uma forma particular de ignorância), são com muitas frequência maus, desumanos, impiedosos, desagradáveis: precisamente como a cruel cultural técnica neocapitalista (contra a qual lutam) quer que eles sejam.

Ao contrário, os jovens ignorantes que se drogam são, em geral, bons, doces, piedosos, cheios de caridade, apostólicos, armados, passivos-agressivos, confiantes (precisamente como os primitivos): a sua contestação in re, ou seja, no próprio corpo, é muito mais terrível e comovente. Eles, sim: se fosse capazes, estariam no pleno direito de atirar a primeira pedra. Ao contrário dos extremistas primeiros da classe, que falam como (maus) livros impressos, eles queimaram as pontes: tornaram impossível para si qualquer possibilidade de integração.

Todavia a sua revolta - ainda que terrível e comovente - é inútil: precisamente porque privada de cultura ou fora da cultura. No fim das contas, é fácil ser bom e doce como os primitivos; é fácil ser piedosos por causa do terror que provém do vazio em que se vive.

Por outro lado (e esta é a conclusão desesperadora), libertar-se dessa falta de cultura ou de interesse cultural parece algo impossível; com efeito, ela provém, provavelmente, de um sentimento mais geral de medo do futuro. Jamais, como nestes anos (nos quais a previsão tornou-se ciência), o futuro foi fonte de tanta incerteza, foi tão parecido com um pesadelo indecifrável.

Pasolini
1922 - 1975