Creio que nos quarenta e cinco anos de minha vida, cada átomo, cada molécula que me compõe, mudou de posição ou dançando se afastou para longe, tornando-se parte de outras coisas. Novas moléculas vieram da relva e de corpos de animais para serem uma parte temporária do meu todo, mas nesse rodopio, leve, aéreo, como enxame de mosquitinhos num feixe de luz, as minhas lembranças subsistem, e na minha frente continua um rosto amado de vinte anos atrás. E esse rosto e os meus anos não estão presos celularmente como num frio e preciso molde fotográfico, grosseira reprodução mecânica do passado. A minha memória retém o passado mas ao mesmo tempo sabe, paradoxalmente, que o passado se foi e jamais voltará. Acaricia rostos mortos e vozes caladas, sim, e perdidas noites da infância. De certo modo estranho, não espacial, contém casas e aposentos desfeitos tronco por tronco, tijolo por tijolo, que têm maior permanência na dança de insignificância que os encerra do que tiveram eles jamais no mundo da realidade.
Loren Eiseley
1907 - 1977