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Constatei quanto os homens fabulam para evitar olhar o real de frente. A criação de além-mundo não seria muito grave se seu preço não fosse tão alto: o esquecimento do real, portanto a condenável negligência do único mundo que existe. Enquanto crença indispõe com a imanência, portanto com o eu, o ateísmo reconcilia com a terra, outro nome da vida.
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Meu ateísmo se ativa quando a crença privada torna-se assunto público e em nome de uma patologia mental pessoal organiza-se também para os outros o mundo que convém. Pois da angústia existencial pessoal à gestão do corpo e da alma dos outros há um mundo no qual se ativam, emboscados, os aproveitadores dessa miséria espiritual e mental. Desviar a pulsão de morte que os aflige para a totalidade do mundo não salva o atormentado e não muda em nada sua miséria, mas contamina o universo. Querendo evitar a negatividade, ele a estende à sua volta, depois gera uma epidemia mental.
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O império patológico da pulsão de morte não se cura com uma difusão caótica e mágica, mas com um trabalho filosófico consigo mesmo. [...] O ateísmo não é uma terapia mas uma saúde mental recuperada.
Michel Onfray | 2007
Trad.: Monica Stahel