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Acho que a literatura "pop" é um negócio capaz de fazer da literatura o que os Beatles fizeram na música - tornar a literatura um troço tão importante pra gente como esse cigarro que você tá fumando e que tá preenchendo um momento de sua vida; como um comprimido de AAS que você toma quando tá com dor de cabeça, entende? Uma literatura que o menino aí do elevador, numa hora de folga, num feriado, possa pegar e ler e entender à maneira dele.
Ainda que eu vibre com Bob Dylan, com os poucos artistas "pops" que eu conheço, eu não tenho nada a ver com o chamado "underground" brasileiro. Eu discordo deles. Acho que nós, de cultura latino-americana, não temos que ser surcusal de um movimento de Nova Iorque ou de Londres.
Para mim, literatura é um negócio que tá acontecendo o tempo todo: tá acontecendo no barzinho [...], tá acontecendo dentro de um elevador com um cara que não estudou, com a garçonete que não é escritora.
Então o negócio é incorporar a linguagem desse pessoal, entende?
No Brasil, quem realmente faz a linguagem do povo é o próprio povo brasileiro. A raiz da linguagem que foi divulgada pelo Pasquim saiu dos morros cariocas. É que a linguagem tá violentamente ligada à ideologia. O facismo em Portugal conseguiu dominar tudo, até a linguagem. No Brasil não - a linguagem protestou, reagiu, a linguagem explodiu por aí, refletindo um conteúdo social violento, certo?
[DRUMMOND, Roberto. A morte de D.J. em Paris. São Paulo: Editora Ática, 1975]