O mundo dos Peanuts é um microcosmo, uma pequena comédia humana para todos os bolsos.
No meio, está Minduim: ingênuo, cabeçudo, sempre inábil e, portanto, votado ao insucesso. Necessitado até à neurose de comunicação e "popularidade", e recebendo em troca, das meninas matriarcais e sabichonas que o rodeiam, o desprezo, as alusões à sua cara de lua-cheia, as acusações de burrice, as pequenas maldades que ferem profundamente. Minduim, impávido, procura ternura e afirmação em toda parte: no baseball, na construção de "papagaios", nas relações com seu cão Xereta, nos contatos de jogo com as meninas. Fracassa sempre. Sua solidão torna-se abissal, seu complexo de inferioridade, esmagador (colorido pela suspeita contínua que também atinge o leitor, de que Minduim não tenha nenhum complexo de inferioridade, mas seja realmente inferior. Pior: é absolutamente normal. É como todos. Por isso, caminha sempre à beira do suicídio ou, na melhor das hipóteses, do colapso: porque busca a salvação segundo fórmulas comodamente propostas pela sociedade em que vive (a arte de fazer amigos, como tornar-se um solicitador animador de reuniões sociais, como conseguir cultura em quatro aulas, a busca da felicidade, como agradar às meninas... obviamente, o Doutor Kinsey, Dale Carnegie e Lin Yutang o arruinaram). Mas como o faz com absoluta pureza de coração, e nenhuma velhacaria, a sociedade está pronta a rejeitá-lo na figura de Lucy, matriarcal, pérfida, segura de si, empresária de lucro certo, pronta a comerciar uma prosopopéia falsa de fio a pavio, mas de indubitável efeito (são as duas aulas de ciências naturais ao irmãozinho Linus, uma mixórdia de idiotices que dão náuseas a Minduim - "I can't stand it", não posso aguentar isso, geme o desgraçado, mas com que armas se pode deter a má-fé impecável, quando se tem a desventura de ser puro de coração?...)
Umberto Eco
Trad.: Pérola de Carvalho