29.9.25

Barulho, falta de concentração e medo


O barulho é apenas um dos males de nosso tempo, ainda que o mais chocante. Os outros são o gramofone, o rádio e, recentemente, a praga da televisão. Fui perguntado por uma organização docente por que, apesar da melhor alimentação, não se conseguia dar o programa todo na escola elementar de hoje. A resposta é: falta de concentração, demasiados estímulos de distração. Muitas crianças fazem seus deveres escolares ouvindo rádio. Tanta coisa é aduzida de fora sobre as crianças, que não precisam mais pensar no que poderiam fazer por iniciativa própria e que exigiria certa concentração.

A amedrontadora poluição da água, a radioatividade aumentando aos poucos e a sombria ameaça da superpopulação com suas tendências genocidas levaram a um medo amplamente difundido, ainda que não conscientizado em geral; ama-se o barulho porque ele impede este medo de manifestar-se.

A maioria das pessoas tem medo do silêncio e, por isso, quando cessa o barulho constante de uma festa, por exemplo, é preciso fazer algo, falar, assobiar, cantar, tossir ou murmurar. A necessidade do barulho é quase insaciável, embora às vezes ele se torne quase insuportável. Mas sempre é melhor do que nada. No chamado ‘silêncio sepulcral’, a sensação é sinistra. Por quê? Há fantasmas rondando? Dificilmente. O que se teme na verdade é o que poderia provir do interior da pessoa, isto é, tudo aquilo de que fugimos através do barulho.

Perdoe-me esta contribuição algo pessimista a uma questão nada agradável de nossa época. Como médico observo naturalmente mais o lado escuro da existência humana do que outros e estou mais inclinado a fazer dos aspectos ameaçadores de nosso tempo objeto de minhas reflexões, do que apresentar razões para considerações otimistas, o que já é feito de sobra por muitas pessoas.

Trechos da carta de C. G. Jung ao Prof. Karl Oftinger 
Setembro de 1957